Art.10.2 Se o Jogador com a vez de jogar tiver menos de dois minutos em seu relógio, poderá reivindicar um empate antes da queda de sua seta. Ele deverá parar os relógios e chamar o árbitro.
a) Se o árbitro estiver convencido de que o adversário não está fazendo esforço para ganhar a partida, por meios normais, ou que não é possível o adversário vencer por meios normais, então deverá declarar a partida empatada. Se não estiver convencido deverá adiar sua decisão ou rejeitar a reclamação;
b) Se o árbitro adia sua decisão, o adversário pode receber um bônus extra de dois minutos de tempo de reflexão e a partida deverá continuar na presença do árbitro, se possível. O árbitro poderá declarar o empate mesmo depois de a seta ter caído. Ele poderá declarar a partida empatada se concorda que a posição final não pode ser ganha por meios normais, ou que o oponente não estava fazendo suficientes tentativas para vencer o jogo por meios normais;
c) Se o árbitro rejeitar a reclamação, o oponente deverá receber um bônus extra de dois minutos de tempo de reflexão;
d) A decisão do árbitro será definitiva (não cabendo recurso) quanto ao disposto nas alíneas “a, b, c”.
Qual o árbitro que já não teve suas dúvidas quanto à aplicação deste artigo das regras do jogo.
De quatro em quatro anos a FIDE modifica as regras do jogo, de acordo com as sugestões recebidas de árbitros e federações filiadas, na tentativa de melhorar sua aplicação e interpretação.
É importante que o árbitro busque sempre melhores informações sobre os mais diversos assuntos dentro da área de arbitragem, ficando mais preparado para resolver as dificuldades técnicas que aparecerem nos eventos. Tenho tentado conseguir informações sobre este assunto de várias maneiras, normalmente conversando com amigos que também são árbitros, e ainda, árbitros estrangeiros. Este contato serve para confirmarmos se os conceitos que estamos adotando estão corretos ou não e se podemos melhorar sua utilização, captando algum procedimento que por acaso tenha nos escapado.
Alguns comentários são necessários sobre a regra em questão:
1) Fica evidente, pelo menos para mim, que a maioria dos jogadores não tem conhecimento da regra em sua totalidade e, quando reivindicam um empate ao árbitro, o fazem de maneira incorreta. Desta falta de procedimento advém alguma conseqüência que afeta diretamente o resultado da partida.
2) Não adianta os jogadores ficarem solicitando empate ao árbitro e continuarem suas partidas sem parar o relógio, ou como já escutei por várias vezes:
a) Quero empate porque estou ganho.
b) Quero empate porque tenho vantagem material.
c) Tenho mate em tantos lances e quero empate.
d) E outras mais interessantes possíveis.
3) A figura do mate ajudado, como alguns costumam dizer, deve ser substituída por mate possível. Vejamos o seguinte diagrama da posição 1:
Posição 1
As pretas tentam dar mate a seu adversário, sem conseguir levar o rei adversário para um dos cantos do tabuleiro ou pelo menos conseguir cortar o auxílio do cavalo a seu monarca. Não pedem empate corretamente em nenhum momento e a sua seta cai. O árbitro acusa a queda da seta e informa que o preto perdeu a partida. Alguns protestos se sucedem sobre a decisão tomada pela arbitragem, mas a decisão é mantida.
Fica claro a falta de conhecimento do condutor das pretas sobre o regulamento, e em que momento da partida poderia ser utilizado, pois aquele jogador que joga para ganhar, mas tem a sua seta caída, perde a partida.
Podemos dizer que o Rei e o Cavalo conseguiriam dar mate?!?!. Dificilmente isto iria acontecer, mas não podemos esquecer que a possibilidade existe e não devemos privar um jogador deste direito.
E tem mais uma situação interessante: depois de uma complicação muito grande na partida, sobram apenas no tabuleiro as mesmas peças do caso anterior. O condutor das pretas, vendo que o tempo está caindo, entrega a sua torre em d5 com xeque, as Brancas verificam que se toma à peça a partida será empate e não tomam a torre e a seta do jogador das Pretas cai, perdendo a partida.
4) O procedimento correto seria parar o relógio, chamar o árbitro e solicitar o empate com base no artigo 10.2, informando ao árbitro que seu oponente não tem como ganhar a partida por meios normais ou que o seu oponente não está fazendo necessários esforços para ganhar a partida por meios normais. A partir desta correta reclamação o árbitro mandará a partida continuar ou não, dando sua decisão final, a qual não caberá recurso.
Algum tempo depois enviei um e-mail a um conceituado árbitro internacional da atualidade sobre o acontecimento acima descrito e recebi a seguinte resposta: Os dois jogadores possuem condições de dar mate a seu adversário, só que o preto tem mais facilidade.
Como último exemplo, coloco a seguinte posição 2:
posição 2
Cai o tempo das Pretas, e perdem. Mas como o jogador das brancas vai ganhar a partida com um peão em a2 que não pode se movimentar?!?!.
Não contribui em nada sabermos ou não como o jogador das brancas ganharia esta partida. Vamos deixar mais interessante ainda. Um peão em a2 não poderia ganhar esta partida??!?! Então colocamos na posição mais um peão branco em b3 na posição 3, abaixo:
posição 3
e a seta cai novamente, com novamente a perda da partida pelas pretas.
Dizer que somente a colocação do novo peão em b3 ganhará a partida não seria a realidade.
Para finalizar este exemplo pergunto, quantas vezes já não perdemos partidas ganhas?????? Principalmente através do nosso velho conhecido, o mate do corredor. E certamente alguns de nós, no futuro, ainda conseguiremos levar este mesmo mate.
Nas regras do jogo, itens 6.10, 9.6 e C.3, tem o seguinte texto, com pequenas modificações entre eles:
A partida está empatada, quando se alcança uma posição em que o oponente não pode dar xeque-mate no rei do oponente por qualquer seqüência de lances legais possíveis, mesmo pelo mais inábil contra-jogo. Isto imediatamente termina a partida desde que o lance produzido esta posição não tenha sido ilegal.
Alguns anos atrás durante o I Campeonato Sul-Americano de Xadrez Rápido, observei o AI argentino Mariano Vargas atuando em uma partida, na qual estavam dois jogadores brasileiros. Em determinado momento o jogador do lado negro começa a jogar mais rápido, explorando claramente o tempo das brancas e tentando derrubar a sua seta.
Na época, o árbitro podia intervir, empatando a partida sem a reclamação do jogador, se verificasse que o adversário estava tentado apenas ganhar no tempo. Isto acaba acontecendo. Vargas informa aos dois jogadores que a partida está empate. O jogador das brancas reclama e não concorda. Vargas informa ao jogador das brancas que seu adversário tentava apenas derrubar a sua seta, tentando ganhar somente no relógio e escuta a seguinte resposta. Sim eu sei que ele quer me ganhar a partida no tempo, mas não tem importância, eu também quero e posso ganhar esta partida no tabuleiro. E foi o que aconteceu, Vargas, concordando com a opinião do jogador, permite que a partida continue e o jogador das brancas ganha a partida.
O que podemos aproveitar de tudo isto?? Que nunca podemos tirar o direito de um jogador de ganhar a sua partida, embora hoje a regulamentação já tenha sido modificada deixando a escolha de cada jogador quando da reivindicação de empate ao árbitro.
Agora com a utilização do relógio eletrônico, todos estes problemas acabam, já que não podemos, ao usarmos este tipo de tempo com incremento, solicitar empate com base neste artigo 10.2 e também não podemos nunca parar de anotar a partida.
Matéria do Árbitro Internacional de Xadrez, Carlos Calleros. Autor do Livro: Xadrez Introdução à Organização e à Arbitragem. Originalmente publicada na Revista Xadrez! número 16,
www.revistaxadrez.com.br